sexta-feira, 1 de abril de 2011

Brasil estende mão fraterna a Portugal

Coimbra, Portugal, 31/3/2011 – O Brasil "poderá ajudar Portugal, como Portugal ajudou o Brasil" em outros tempos e outras circunstâncias. Esta frase é a síntese mais destacada da rápida visita da presidenta Dilma Rousseff. "Temos investimentos de Portugal no Brasil e vice-versa, mas precisamos de uma garantira real ou de algum ativo", respondeu Dilma à pergunta da IPS, perante um grupo de jornalistas durante sua visita a Coimbra, 190 quilômetros ao Norte de Lisboa.

Dilma, que coincidiu em sua chegada a Portugal com Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou que o Brasil poderá ajudar na recuperação da economia portuguesa, uma postura que coincide com a expressa poucas horas antes por Lula. Seu regresso antecipado, pela morte do ex-vice-presidente José Alencar, significou o cancelamento dos encontros programados para a tarde de ontem com o presidente de Portugal, Aníbal Cavaco Silva; com o primeiro-ministro, José Sócrates, e com o presidente do parlamento, Jaime Gama.

Nos fatos, significa que realizou apenas a parte não oficial da visita, que começou no dia 29, para ontem assistir, a título privado, a entrega do título de doutor a Lula pela Universidade de Coimbra, onde estudou boa parte dos intelectuais e políticos brasileiros, ato do qual também participaram os presidentes Cavaco Silva e Pedro Pires, de Cabo Verde.

"Mais do que um reconhecimento pessoal, creio que este diploma é uma homenagem ao povo brasileiro, que fez nos últimos oito anos, de modo pacífico e democrático, uma revolução econômica e social", afirmou Lula em aula magna da Universidade, ao receber o título de doutor. A luta contra a pobreza durante seus governos também deu a Lula outro prêmio, recebido no dia 29 em cerimônia realizada no parlamento português. Trata-se do prêmio Norte-Sul, do Conselho da Europa, que segundo a instituição "distingue personalidades que contribuem com sua ação e seu exemplo para a promoção da solidariedade e interdependência mundiais".

Lula, ao agradecer o prêmio, defendeu "uma nova governança mundial", mediante a urgente reforma da Organização das Nações Unidas e do sistema financeiro internacional, o fim da tolerância às violações dos direitos humanos e garantia do crescimento econômico com maior justiça na distribuição da renda. Sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o ex-presidente deplorou que, passados tantos anos, este documento ainda não seja respeitado em diversos lugares do mundo. Seus enunciados somente serão uma realidade "se houver uma ação corajosa e contínua dos organismos multilaterais e da sociedade civil", acrescentou.

Dilma prometeu, diante do estrangulamento da economia portuguesa por parte dos mercados financeiros, "fazer todo o possível para ajudar, porque não se trata de um país qualquer, mas, culturalmente falando, de uma nação com a qual temos uma relação umbilical, no sentido literal da palavra. O Brasil tem um compromisso com Portugal e sempre terá", assegurou. Um dia antes, Lula disse que a ajuda mediante a compra de dívida portuguesa é um assunto que deve ser discutido pela presidenta, ressaltando que "tudo o que pudermos fazer para ajudar Portugal deveríamos fazer, pois penso que merece essa compreensão do Brasil".

O ex-presidente fustigou uma provável intervenção do Fundo Monetário Internacional na frágil economia lusa, porque "não resolve o problema deste país, como não resolveu o do Brasil, como não resolveu outros problemas". E acrescentou que "cada vez que o FMI tentou cuidar das dívidas dos países criou mais problemas do que soluções. A Europa é muito grande e se quiser poderá encontrar soluções para Portugal, Grécia e Espanha". Apesar deste "dever" do Brasil de ajudar Portugal, Dilma esclareceu que a possível compra de dívida soberana portuguesa deverá respeitar as normas do Banco Central brasileiro.

As declarações dos visitantes aconteceram bem quando os mercados continuam castigando Portugal, que sofreu, no dia 29, nova baixa na escala de confiabilidade de sua economia. Um comunicado da agência de qualificação norte-americana Standard & Poor's provocou alta de 9,04% nas taxas cobradas pelos investidores para comprar obrigações do Tesouro a cinco anos e 8,023% para dez anos, enquanto as com prazo de dois anos são negociadas a 7,8%, todos níveis máximos históricos.

Por sua vez, o Banco de Portugal divulgou, no mesmo dia, uma projeção da economia com queda estimada em 1,4% este ano, maior do que as previsões anteriores, alertando que a contração poderá ser maior ainda se forem tomadas novas medidas de austeridade, porque um dos efeitos que causarão é a forte queda do consumo interno. O desemprego em Portugal já se aproxima dos 12% da população economicamente ativa, segundo dados oficiais, e chega a 15% segundo os sindicatos. A inflação, no entanto, cuja média nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) chegou a 2,4% no ano passado estatisticamente fechado em fevereiro, neste país foi de 3,5%.

Portugal não é para o Brasil apenas "o país irmão" na União Europeia, mas também, como disse Dilma Rousseff, "é a porta de entrada de seu país" no bloco europeu de 27 Estados, uma posição estratégica muito importante para os capitais do gigante sul-americano. Além da forte relação histórico-cultural e por este motivo pragmático, Dilma admite a compra da dívida pública portuguesa, para isso tendo de "estudar a melhor maneira" de participação na recuperação da economia de Portugal.

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